Semana de cão
Minha semana começou assim:
Segunda-Feira: Às três da manhã minha mãe me liga para saber o telefone celular do meu irmão. Ainda na cama, peguei os óculos na mesinha de cabeceira, abri a caderneta e passei-lhe o número. Larguei os óculos sobre o leito e adormeci com o telefone na orelha. Quando estava pegando a caderneta, esbarrei no despertador, que travou sem que eu o percebesse.
09:50 h. Acordei sobressaltado com o barulho da empregada na cozinha. Olhei as horas e não acreditei. Saltei da cama lançando os óculos ao chão, quase ao mesmo tempo em que os pisava, quebrando-os. Corri para o banheiro para fazer a barba o mais rápido possível.
Estava agendado para as nove horas uma reunião com os gerentes de setor sobre um problema da empresa, intitulado: "A FALTADE PONTUALIDADE DOS EMPREGADOS E SEU CUSTO PARA A EMPRESA". O tema era meu...
Não me perguntem como, mas fazendo a barba consegui cortar o nariz e metade de uma sobrancelha. Devo confessar que sou quase cego sem os óculos. Tentei consertar usando o lápis de sobrancelha da minha esposa.
A empregada, uma senhora de meia-idade, usa os óculos de mesmo grau que o meu, ou quase. O chato é que eles são antigos, da época das discotecas. Tem aquele formato de gatinha, aros rosa-choque e pedrinhas coloridas.
Mas eu não tinha tempo de passar em um oculista. Afanei os óculos da empregada e saí para a rua. Por vergonha de ser visto dirigindo usando aquela armação, fui de táxi para o trabalho. Desci na calçada defronte ao prédio exatamente às 10:15 , na hora em que uma senhora gorda saía da lanchonete com um sanduíche gorduroso, empanturrado de cebolas e catchup. Foi um esbarrão daqueles! A salsicha veio parar no bolso da minha camisa, que ficou toda emporcalhada de cebola e molho de tomate. E eu ODEIO cachorro-quente!
Penalizado com a minha situação, o porteiro gay do edifício me emprestou uma camisa amarela e sua gravata verde abacate. Eu estava uma pilha. Confesso que quase chorava.
Como poderia aparecer diante dos gerentes de toda empresa vestido daquele jeito e ainda atrasado? Me deram um calmante e nem pestanejei. Tomei um copo de um refresco de groselha do porteiro para ajudar a engolir. O porteiro notou que minha calça também estava suja, na altura do zíper. Ali não teve jeito. Tive que lavar mesmo. Para secar mais rápido, coloquei uma folha de jornal amassada por dentro da calça, enquanto subia pelo elevador.
No elevador, examinei a minha figura no espelho e notei que até que não ficara mal com aquela camisa amarela e a gravata verde. Os óculos de aro rosa, em forma de olhar de gatinha, com aquelas pedrinhas coloridas também combinavam com a minha sobrancelha desenhada. E tudo combinava com os lábios rosados pela groselha... na verdade, o elevador estava tão bonito... o mundo era tão bonito... me deu vontade de chorar de felicidade.
11:15 h. Saí do elevador meio cambaleante... que remédio porreta! Acho que eu estava cantando quando entrei na sala de reuniões. O superintendente geral estava na cabeceira da mesa. Fui para minha cadeira, pedindo desculpas a todos pela demora e sentei...no colo de alguém. Era o chefe de RH.
Não sei bem exatamente o que disse durante a reunião, mas o superintendente não parava de me olhar. Até que percebi que havia esquecido de retirar o jornal de dentro das calças. Aquilo me dava um volume monstruoso!
Em algum momento do meu falatório esbarrei no copo dágua à frente de um colega e o líquido se esparramou por sobre suas pernas. Rapidamente, peguei um guardanapo e tentei secar a calça do colega, que deu um tapa nas minhas mãos. Acho que ele pensou que eu o estava assediando.
12:00 h. Olhei para o relógio e não compreendi direito como estava sentado na calçada do prédio. Lembro assim, meio vagamente, de ser arrastado para fora da sala, com o superintendente berrando "FORA!FORA! RUA!..."
Uma senhora passou e jogou uma moeda no meio das minhas pernas.
Um guarda municipal me pegou pelo braço e me arrastou para um ônibus que me levou para um abrigo de mendigos. A língua estava meio presa na boca. Quando tentava falar, meio que grunhia. No fim da tarde, um grupo de mendigos conseguiu fugir do abrigo e me arrastaram junto. Sentamos em uma praça e ficamos todos conversando. Um grupo de estudantes veio e tirou algumas fotos.
Terça-feira: Acordei deitado na calçada, abraçado a um mendigo enorme, que cheirava como um bueiro em dia de chuva. Minha carteira, dinheiro, relógio, documentos, sapatos, tudo sumira.
Ficara apenas com a camisa amarela, a gravata verde, os óculos de gatinha (por que será que não os roubaram?) e a calça com uma mancha enorme, como se eu houvesse me urinado. Sentei no banco da praça e fiquei pensando em nunca mais voltar para casa.
Outra senhora idosa me jogou mais uma moeda.
Estava morto de fome e o mendigo com o qual dormira me trouxe um sanduíche de ovo e uma garrafa de cachaça. Bebi no gargalo mesmo. Devo ter bebido bastante, porque não lembro de mais nada desse dia.
Quarta-feira: Acordei de novo abraçado ao mendigo. Almoçamos juntos e bebemos mais algumas garrafas de cachaça.
Quinta-feira: Passei a noite em claro. Marreta - esse era o apelido do mendigo - passou a noite fora. Foi muita falta de consideração dele. Tivemos uma discussão e ele me bateu. Levantei muito chateado e resolvi voltar para casa.
Quinta à noite: cheguei em casa andando e inventei uma história de que fora seqüestrado. Era mais fácil de explicar.
Sexta-feira: minha foto saiu na capa de uma revista sobre gays abandonados na terceira idade.
Sábado: Minha mulher, meus filhos e a empregada foram embora. O Marreta que fez o almoço.
Como ele cozinha mal!
Autor: J.Miguel
Segunda-Feira: Às três da manhã minha mãe me liga para saber o telefone celular do meu irmão. Ainda na cama, peguei os óculos na mesinha de cabeceira, abri a caderneta e passei-lhe o número. Larguei os óculos sobre o leito e adormeci com o telefone na orelha. Quando estava pegando a caderneta, esbarrei no despertador, que travou sem que eu o percebesse.
09:50 h. Acordei sobressaltado com o barulho da empregada na cozinha. Olhei as horas e não acreditei. Saltei da cama lançando os óculos ao chão, quase ao mesmo tempo em que os pisava, quebrando-os. Corri para o banheiro para fazer a barba o mais rápido possível.
Estava agendado para as nove horas uma reunião com os gerentes de setor sobre um problema da empresa, intitulado: "A FALTADE PONTUALIDADE DOS EMPREGADOS E SEU CUSTO PARA A EMPRESA". O tema era meu...
Não me perguntem como, mas fazendo a barba consegui cortar o nariz e metade de uma sobrancelha. Devo confessar que sou quase cego sem os óculos. Tentei consertar usando o lápis de sobrancelha da minha esposa.
A empregada, uma senhora de meia-idade, usa os óculos de mesmo grau que o meu, ou quase. O chato é que eles são antigos, da época das discotecas. Tem aquele formato de gatinha, aros rosa-choque e pedrinhas coloridas.
Mas eu não tinha tempo de passar em um oculista. Afanei os óculos da empregada e saí para a rua. Por vergonha de ser visto dirigindo usando aquela armação, fui de táxi para o trabalho. Desci na calçada defronte ao prédio exatamente às 10:15 , na hora em que uma senhora gorda saía da lanchonete com um sanduíche gorduroso, empanturrado de cebolas e catchup. Foi um esbarrão daqueles! A salsicha veio parar no bolso da minha camisa, que ficou toda emporcalhada de cebola e molho de tomate. E eu ODEIO cachorro-quente!
Penalizado com a minha situação, o porteiro gay do edifício me emprestou uma camisa amarela e sua gravata verde abacate. Eu estava uma pilha. Confesso que quase chorava.
Como poderia aparecer diante dos gerentes de toda empresa vestido daquele jeito e ainda atrasado? Me deram um calmante e nem pestanejei. Tomei um copo de um refresco de groselha do porteiro para ajudar a engolir. O porteiro notou que minha calça também estava suja, na altura do zíper. Ali não teve jeito. Tive que lavar mesmo. Para secar mais rápido, coloquei uma folha de jornal amassada por dentro da calça, enquanto subia pelo elevador.
No elevador, examinei a minha figura no espelho e notei que até que não ficara mal com aquela camisa amarela e a gravata verde. Os óculos de aro rosa, em forma de olhar de gatinha, com aquelas pedrinhas coloridas também combinavam com a minha sobrancelha desenhada. E tudo combinava com os lábios rosados pela groselha... na verdade, o elevador estava tão bonito... o mundo era tão bonito... me deu vontade de chorar de felicidade.
11:15 h. Saí do elevador meio cambaleante... que remédio porreta! Acho que eu estava cantando quando entrei na sala de reuniões. O superintendente geral estava na cabeceira da mesa. Fui para minha cadeira, pedindo desculpas a todos pela demora e sentei...no colo de alguém. Era o chefe de RH.
Não sei bem exatamente o que disse durante a reunião, mas o superintendente não parava de me olhar. Até que percebi que havia esquecido de retirar o jornal de dentro das calças. Aquilo me dava um volume monstruoso!
Em algum momento do meu falatório esbarrei no copo dágua à frente de um colega e o líquido se esparramou por sobre suas pernas. Rapidamente, peguei um guardanapo e tentei secar a calça do colega, que deu um tapa nas minhas mãos. Acho que ele pensou que eu o estava assediando.
12:00 h. Olhei para o relógio e não compreendi direito como estava sentado na calçada do prédio. Lembro assim, meio vagamente, de ser arrastado para fora da sala, com o superintendente berrando "FORA!FORA! RUA!..."
Uma senhora passou e jogou uma moeda no meio das minhas pernas.
Um guarda municipal me pegou pelo braço e me arrastou para um ônibus que me levou para um abrigo de mendigos. A língua estava meio presa na boca. Quando tentava falar, meio que grunhia. No fim da tarde, um grupo de mendigos conseguiu fugir do abrigo e me arrastaram junto. Sentamos em uma praça e ficamos todos conversando. Um grupo de estudantes veio e tirou algumas fotos.
Terça-feira: Acordei deitado na calçada, abraçado a um mendigo enorme, que cheirava como um bueiro em dia de chuva. Minha carteira, dinheiro, relógio, documentos, sapatos, tudo sumira.
Ficara apenas com a camisa amarela, a gravata verde, os óculos de gatinha (por que será que não os roubaram?) e a calça com uma mancha enorme, como se eu houvesse me urinado. Sentei no banco da praça e fiquei pensando em nunca mais voltar para casa.
Outra senhora idosa me jogou mais uma moeda.
Estava morto de fome e o mendigo com o qual dormira me trouxe um sanduíche de ovo e uma garrafa de cachaça. Bebi no gargalo mesmo. Devo ter bebido bastante, porque não lembro de mais nada desse dia.
Quarta-feira: Acordei de novo abraçado ao mendigo. Almoçamos juntos e bebemos mais algumas garrafas de cachaça.
Quinta-feira: Passei a noite em claro. Marreta - esse era o apelido do mendigo - passou a noite fora. Foi muita falta de consideração dele. Tivemos uma discussão e ele me bateu. Levantei muito chateado e resolvi voltar para casa.
Quinta à noite: cheguei em casa andando e inventei uma história de que fora seqüestrado. Era mais fácil de explicar.
Sexta-feira: minha foto saiu na capa de uma revista sobre gays abandonados na terceira idade.
Sábado: Minha mulher, meus filhos e a empregada foram embora. O Marreta que fez o almoço.
Como ele cozinha mal!
Autor: J.Miguel
Ola Anderson, conheci teu blog hoje e achei muito engracado. Gostei muito dessa historia - Semana de cao - . Esses casos acontecem com muita gente, nao nessa magnitude, mas tem dias que parece que nada da certo.
ResponderExcluirVou ficar sempre visitando teu blog (se possivel, diariamente). Vou te pedir um favorzinho tambem... Podes dar uma passadinha no meu humilde blog???
O endereco eh
http://josyca.blogspot.com
Obrigada...
Josi